- 11 de setembro de 2024
FALTA EM ALGUÉM
JOBIS PODOSAN
Seguramente está faltando alguém no Governo e no Congresso Nacional que possa aliviar os vexames constitucionais que estão acontecendo no Brasil. É como se não existisse Constituição vigente ou como esta fosse uma mera folha de papel, como ensinou Ferdinand Lassale, na sua obra A Essência da Constituição, publicada em meados do século XIX. Até no STF, supreendentemente, parece que a Constituição é apenas fruto dos chamados “fatores reais do poder”, como vimos em artigo da semana passada quando o STF quase ignorou dispositivo explícito da Constituição, escapando por pouco de tomar uma decisão vexaminosa, por negar direito explicitamente concedido na Constituição aos deputados estaduais.
Este artigo vem a propósito da discussão sobre onde colocar o COAF, que vem sendo debatida na imprensa, na Câmara de deputados e nas redes sociais. Esse órgão já existe e agora a Câmara o está colocando no Ministério da Economia, ao de no Ministério da Justiça e Segurança Publica, como quer o governo. Discussão sem fim, com cada um querendo a primazia da localização do órgão que, até pouco tempo, quase ninguém sabia da sua existência.
Circula no Watsapp, como resultado de uma gincana que:
“Não votaram contra o governo, votaram contra a lógica, contra os princípios da honestidade, contra o povo e contra os interesses de moralização do Brasil. São crápulas irresponsáveis, que utilizam de seus cargos, delegados pelos cidadãos, para cometer ilegalidades em benefício próprio. Quem tem medo da justiça é bandido. Você que é eleitor, compactua com marginais que saqueiam seu dinheiro? Você que paga escola, plano de saúde e que vive acuado p violência, vai continuar votando em parlamentares ladrões? Anote todos que votaram NÃO e na próxima eleição, use sua arma, o VOTO”.
Observem agora o que diz a Constituição:
Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:
CF, Art. 84, VI - dispor, mediante decreto, sobre: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 32, 11 de setembro de 2001)
a) organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos; (Incluída pela Emenda Constitucional nº 32, 11 de setembro de 2001)
Interpretando o dispositivo constitucional, verifica-se que a competência do Congresso Nacional só existe quando se tratar de: 1) aumento de despesa, 2) criação ou extinção de órgão. Quando tratar apenas de organização e funcionamento, a competência é PRIVATIVA do Presidente da República. Ele põe o COAF, ou qualquer outro órgão da administração federal, onde ele quiser, sendo o decreto o instrumento legítimo, para tal. O Congresso Nacional é incompetente para tratar da localização de órgãos do Poder Executivo, ressalvadas as duas exceções acima. Se no Ministério da Justiça, no da Economia, no da Defesa ou até no da Agricultura, é o Presidente que decide. Ressalte-se que esse tipo de Decreto, por ser imediatamente infraconstitucional, tem força de lei. Os decretos em geral servem para regulamentar as leis para lhes facilitar a execução, é o que diz o art. 84, inciso IV: compete ao presidente da Repúblicasancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução. Porém, tratando-se de decreto autônomo, cuja força deriva diretamente da Constituição, ele tem força de lei. A decisão do Congresso de colocar este ou aquele órgão neste ou naquele Ministério, se assim for aprovada, deve ser vetada pelo Presidente da República por inconstitucionalidade, por invasão de competência privativa do Chefe do Executivo. A organização e funcionamento dos poderes, é da atribuição privativa de cada um, cada qual arruma sua casa do jeito que quiser.
Decerto que o Presidente da República sabe disto, pois esta competência foi incluída na Constituição pela Emenda Constitucional nº 32, de 11 de setembro de 2001 e é uma das mais relevantes emendas constitucionais até hoje editadas e o atual Presidente da República estava lá, como Deputado, na Câmara Federal e votou nela!! Como então esta discussão prosperou tanto, se discutiu tanto, chegando a viralizar nas redes sociais como uma questão moral? Como já dito, a competência para dispor sobre os seus respectivos órgãos, é dos três poderes, cada poder coloca os seus órgãos onde lhes é conveniente, sem interveniência dos demais, dentro da chamada competência interna corporis. Nem o Poder Judiciário pode arbitrar esta questão, desde que este também respeite a Constituição!
São 513 deputados e milhares de assessores na Câmara, será que ninguém viu essa discussão tola? A Imprensa, a grande ou a pequena, os ministérios interessados, a Casa Civil, e as redes sociais que parecem tudo saber, não detectaram, por uma voz sequer, que a Câmara está votando o estupro do Poder Executivo. Bastava uma voz para dizer: senhores, esta matéria não pode ser discutida no Legislativo. É competência privativa do Executivo. A Constituição não pode ser ignorada! O Presidente põe o COAF onde ele quiser. Mesmo que o órgão estivesse sendo criado e fosse botado na estrutura do Ministério da Economia, ainda assim o Presidente da República poderia, por decreto, mudá-lo para o Ministério da Justiça. Mais ainda, se esta matéria for também aprovada no Senado e o Presidente da República o sancionar e fizer publicar a lei, ainda assim poderá, no dia seguinte à publicação, transferir o COAF para onde quiser.
É de se esperar que o Senado Federal, que vai hoje (dia 28/05, dia que estou escrevendo esta matéria), corrija o despautério e pelas razões corretas. Não basta que o COAF fique não Ministério da Justiça e Segurança Pública, é preciso que fique porque o Congresso não pode deliberar sobre onde colocá-lo.
A questão é simples: onde fica ou deve ficar o COAF?
A resposta é singela: onde o Presidente quiser.
Está sobrando incompetência em toda parte, para cima e para baixo, para a esquerda e para a direita.
Ou está faltando alguém, uma voz apenas, que leia a Constituição.